segunda-feira, 16 de maio de 2011

Apologia das Rugas



Alternar de estações
Nascimento, crescimento, envelhecimento e morte
Grande ciclo, interminável espiral

Lucidez fugidia procura a realidade, encontra a ilusão
Consciência entorpecida anela o permanente, experimenta o transitório
Alma negligente desconhece a essência, obedece à aparência

Dolorosa visão...

Pernas trôpegas seguindo o devaneio
Braços trêmulos agarrando o efêmero
Mente alienada idealizando o aspecto

Engano vulgar
Apego impossível
Desejo infértil

Inexpugnáveis, os dias seguem
Obstinados, os instintos lutam
Abençoados, os tropeços ensinam

Cada passo, uma marca
Cada dor, uma linha
Cada superação, um sulco

Ocultar ou mostrar a marca
Rejeitar ou aceitar a linha
Transfigurar ou manter o sulco

Olvidar caminhos trilhados?
Depreciar obstáculos enfrentados?
Descartar êxitos conquistados?

No despertar da consciência...

Condicionado, o olhar se aprofunda
Descoberta, a sensibilidade se depura
Estimulada, a percepção se aguça

Toco marcas que me comovem
Resvalo linhas que me enternecem
Afago sulcos que me assossegam

Respeito todas as marcas
Admiro todas as linhas
Reverencio todos os sulcos

Toda a minha história, desenhada, pintada e esculpida...em mim mesmo


Imagem extraída da Tela: "Auto Retrato" de Lucien Freud

2 comentários:

  1. Lindas e sábias palavras.
    Pois pode-se arrancar e colocar um novo rosto,não adiantará, tão somente!
    A beleza nasce, primeiro por dentro!
    Os caminhos já percorridos, se com dignidade,e em Deus, as rugas talvez se atenuem na aparência! Tomara!

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  2. Esta consciência e aceitação das marcas que o tempo nos traz é, pra mim, a verdadeira beleza.
    Nossa imortalidade se expande no cosmos. E não nos cosméticos...
    Continue, amigo, seus textos são muito bem vindos sempre!!!!!!

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